quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Como sempre



- Ei!

Ouviu o chamado assim que ia descer do ônibus, o qual o deixava a algumas quadras de casa após os dias de trabalho. Quem o chamava era aquela menina que estava no ônibus todos os dias. Aquela menina que ele procurava com os olhos ao passar pela catraca. Quer dizer, não se sabe bem se era uma menina ou moça, pois era difícil definir uma idade. "Algo entre 16 e 28", pensava, incerto e despretensioso.

Era a segunda vez em sua vida que havia ouvido sua voz. Da outra vez, ela estava conversando ao celular quando ele entrou no ônibus. O barulho do motor e das pancadas do veículo com o caminho esburacado impediram que ele pudesse entender o tom da conversa. Era uma voz normal, até um pouco grave. Com base nisso, tinha certeza de que ela era tímida e inteligente. Vai saber...

Ela, aliás, não era de uma beleza incontestável. Era daquelas que deixam os rapazes em dúvida. Ou não.

- Olha só estas curvas, meu Deus... mas, este nariz é meio macho, não?
- Fica quieto homem... uma dessas é pra casar! Até achar uma melhor e mais nova, claro.


Ele tinha curiosidade de saber se ela namorava. Sabia que ela usava uma aliança, mas, como não tinha a menor idéia de qual dedo de qual mão siginificaria "namoro", tinha esperanças.

Mas, na verdade, não pensava nela no passar dos dias. Apenas a partir do momento em que a procurava com os olhos ao pagar a passagem, até o instante de apertar o botão para pedir que o motorista o libertasse daquela coisa motorizada e barulhenta.


- Ô! Heein... - repetiu ela.

Depois de pensar em algumas centenas de hipóteses em menos de 4 segundos, virou-se e olhou para ela com firmeza, como ele fizera algumas vezes antes - claro, sem nunca ter sido percebido pela menina-moça.

Quando se deu conta da realidade, viu que ela olhava para a parte da frente do ônibus. Ficou estático. "Mas que diabos?"

- Motorista, me deixa na próxima esquina! - disse ela.
- Ô-hopa! - respondeu o motorista, numa mistura de simpatia com falta de vocabulário.

Nisto, a porta fechou e o veículo arrancou. Parou umas duas quadras para frente. Ele, ainda matutando, se deu conta de que havia sido iludido pela sua própria mente assim que a porta abriu novamente, e ouviu a voz dela pela terceira ou quarta vez na vida.

- Licença!

Ela desceu, e se foi para casa sem nem olhar para trás. Passo por passo, ele também desceu, e viu que o que havia de ser feito era ir para casa também.

Era apenas mais um dia normal.
A única diferença é que teria que andar mais algumas quadras. E que, enquanto caminhava, desabou o temporal mais forte dos últimos anos sobre a cidade.


4 comentários:

Zeca Monteiro disse...

"Algo entre 16 e 28". hahaha
Muito bom.

Resolveram postar todos os textos de uma vez, é?
Espero que continue assim!

Bruno disse...

Hãm, acho que eu conheço esse cara

Rodrigo disse...

Não exatamente, pode acreditar

Unknown disse...

"- Ô! Heein... - repetiu ela.

Depois de pensar em algumas centenas de hipóteses em menos de 4 segundos, virou-se e olhou para ela com firmeza, como ele fizera algumas vezes antes - claro, sem nunca ter sido percebido pela menina-moça.

Quando se deu conta da realidade, viu que ela olhava para a parte da frente do ônibus. Ficou estático. "Mas que diabos?""


CARREGANDO MEMÓRIAS Déjà Vu _ ...
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Pq eu me vi nessa situação diversas vezes ?_?

sou invisível ao resto do mundo D=

[e o mais estranho, é que o código de confirmação a ser digitado para que seja postado meu comentário é Cleise =O]