sexta-feira, 6 de julho de 2012

Dança em silêncio

Ela se vestiu como se fosse a uma daquelas velhas festas do clube oito de maio – elegante, mas discreta. Como se, por mágica, os anos de juventude tivessem voltado e o Roberto estivesse na soleira da porta, esperando para levá-la dançar a noite toda. As rugas e o cabelo prateado no espelho desmentiam.

Chegou sete em ponto no teatro municipal. Viu velhos amigos, que disseram tudo ou nada que dizem amigos de muito tempo. Disseram como era bom vê-la, como estava bem, como tinham saudade. O espetáculo já iria começar, diziam, e entravam, chamando para que ela entrasse com eles. Já vou, mentia. Como das outras tantas vezes que tentou, esperou a porta fechar para se virar e ir embora.

Ou dançavam ou iam para o teatro ouvir o que estivesse sendo apresentado, ela e o Roberto. Deixavam o filho pequeno na casa de um casal de amigos e iam. Não conseguia sem ele. Sem eles. A lembrança era um silêncio tão alto.

No quarto, quase adormecendo, ouvia a apresentação inteira. As cordas, os metais, a percussão. Dançava lentamente enquanto pegava no sono. Mas tinha a impressão de que nunca mais conseguiria dormir. Na cômoda ao lado da cama, o silêncio da foto envelhecida do marido e do filho gritava, gritava e gritava.